“Copom pode ser mais suave e antecipar corte da Selic”, diz Reinaldo Le Grazie
Entrevista com Reinaldo Le Grazie para o TC
Por: Patricia Lara
São Paulo, 8/3/2023 – A economia brasileira está dando sinais de que se engasgou, segundo o ex-diretor de política monetária do Banco Central, sócio e presidente da Panamby Capital, Reinaldo Le Grazie.
Na visão do gestor, a queda na concessão de crédito a empresas e famílias no primeiro trimestre deste ano deve puxar para baixo o Produto Interno Bruto e inflação, o que permitiria ao Comitê de Política Monetária (Copom) adotar um tom mais suave no comunicado de seu próximo encontro, marcado para 21 e 22 de março.
Em entrevista exclusiva à Mover, Le Grazie disse que a Panamby Capital prevê o início do corte da Selic já neste ano, ante a previsão anterior de que o espaço para o alívio só viria em março de 2024.
“O Copom pode começar a cortar a taxa Selic no terceiro trimestre, se a inflação ficar comportada”, disse, sem citar um nível específico para o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA). Para 2023, a projeção da Panamby para o principal indicador de inflação brasileiro é de 6,30%.
Le Grazie afirmou que o consumidor está sem capacidade de crédito, pois o comprometimento de renda e endividamento das famílias está muito alto e isso afeta o consumo. "Ainda que o nível de crédito em relação ao PIB no Brasil esteja abaixo do observado em economias pares, esse mercado precisa respirar. Esse engasgamento do crédito deve ser um limitador para o crescimento do PIB, afetando bens mais sensíveis ao crédito como carros e itens da linha branca. Esse ponto se alinha a outras variáveis para justificar uma narrativa de enfraquecimento da economia e da inflação adiante."
Segundo o ex-diretor do BC, o spread subiu sob efeito dos problemas contábeis que levaram a rede varejista Americanas a pedir recuperação judicial, mas isso não fez secar a oferta de crédito ou a liquidez das empresas. "O episódio deu um susto, mas não está faltando linha de crédito e não houve contaminação disseminada da crise da varejista. O que tem ocorrido é o pedido de mais garantia pelos bancos cedentes de empréstimos, enquanto os fundos de crédito estão rendendo menos que CDI", afirmou."O mercado está se regularizando, ainda que não vá chegar ao preço que era anteriormente."
Outra variável que justifica adotar um viés de queda para os juros, segundo Le Grazie, é a solução dada para a reoneração dos combustíveis. Para ele, o anúncio eliminou uma dúvida do cenário, deixando um pedaço do ônus para o fiscal e outro para inflação. “Joga a favor para a tendência da queda de juros”, afirmou.
Em relação ao quadro fiscal, Le Grazie acredita que as dúvidas permanecem as mesmas, mas que a conversa sobre uma nova regra está avançando, ainda que sem novidades até o momento. Do lado externo, ele enxerga que o cenário melhorou um pouco, o que não é positivo do ponto de vista contribuidor para a desinflação doméstica. E a possibilidade de taxas de juros externas para cima não joga a favor de queda de juros no Brasil. "O mercado externo pede cautela", alertou.
Para Le Grazie, o Copom deve elencar em seu balanço de risco essas ponderações de redução da concessão de crédito e piores projeções para o PIB. Porém, o mercado já está prevendo esse caminho. Tanto que as projeções para inflação em 2023 e 2024 não subiram no boletim Focus divulgado na última segunda-feira.
A mediana das projeções para o IPCA em 2023 colhidas pelo Banco Central ficou estável em 5,9% no boletim Focus divulgado na segunda-feira – foi a primeira em 11 semanas que os economistas ouvidos não elevaram as estimativas. Para 2024, a projeção seguiu em 4,02%.
“As taxas de juros futuros estão caindo e o mercado está enxergando isso. Essas forças podem levar o Copom a ser mais ameno”, disse Le Grazie. Para ele, como um comunicado mais suave só deve confirmar os preços no mercado de juros, o ambiente deve seguir positivo. Mas isso dependerá de um comunicado do Copom e de uma ata com leitura crível, diz. “Nesse contexto, a curva não inclina. Inclina se o comunicado e ata fizerem uma leitura inconsistente”, afirmou Le Grazie, que se opõe à mudança da meta de inflação.
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